As palavras faltaram nos lábios emudecidos da liberdade encarnada numa guitarra plangente.
E por sobre notas secas as cordas vibraram gritos de revolta e libertação de anseios reprimidos.
Mas nada pode calar o grito intempestivo da justiça agrilhoada nas prisões mais hediondas.
Por isso um dia houve em que as esperanças tanto tempo incontidas estalaram em alegria.
J M [23.02.1987]
Amigo Maior que o pensamento Por essa estrada amigo vem Não percas tempo que o vento É meu amigo também
Em terras
Em todas as fronteiras Seja bem-vindo quem vier por bem Se alguém houver que não queira Trá-lo contigo também
Aqueles
Aqueles que ficaram (Em toda a parte todo o mundo tem) Em sonhos me visitaram Traz outro amigo também
José Afonso
O pintor morreu
envolto em rosas de maio,
olhando os meninos do Bairro Negro,
cantando os cravos rubros
de um abril florido.
Em Grândola poeta-libertador,
dum povo adormecido,
na longa noite de 33;
em abril soldado em flor
que desabrochou a 24,
numa manhã ingente e fresca
florida em liberdade.
Na noite, cantor-maldito
de vampiros e eunucos
cuja voz rompeu os tímpanos
de absurdos assombros:
Peniche, Caxias, Tarrafal.
Em Coimbra, amigo do vento
levado do Choupal à Lapa
nas brisas ternas dos sonhos
até aos filhos da madrugada.
Em Portugal poeta-músico
cujo machado não corta
a enraizada lembrança
gravada a palavras-fogo
no peito da nossa memória.
E se alguém se enganou
com seu olhar modesto
verá correr as águas claras
dos mananciais da música
que guardam perenemente
a timbrada voz universal
de abril-liberdade!
J M (23.02.1987)
VIDEO
Maio maduro Maio Quem te pintou Quem te quebrou o encanto Nunca te amou Raiava o Sol já no Sul E uma falua vinha Lá de Istambul.
Sempre depois da sesta Chamando as flores Era o dia da festa Maio de amores Era o dia de cantar E uma falua andava Ao longe a varar
Maio com meu amigo Quem dera já Sempre depois do trigo Se cantará Qu'importa a fúria do mar Que a voz não te esmoreça Vamos lutar
Numa rua comprida El-rei pastor Vende o soro da vida Que mata a dor Venham ver, Maio nasceu Que a voz não te esmoreça A turba rompeu
José Afonso
Foi há 25 anos que nos deixou. Legou-nos a sua música e as suas palavras!
VIDEO
Cobre-te canalha
Na mortalha
Hoje o rei vai nu
Os velhos tiranos
De há mil anos
Morrem como tu
Abre uma trincheira
Companheira
Deita-te no chão
Sempre à tua frente
Viste gente
Doutra condição
Ergue-te ó Sol de Verão
Somos nós os teus cantores
Da matinal canção
Ouvem-se já os rumores
Ouvem-se já os clamores
Ouvem-se já os tambores
Livra-te do medo
Que bem cedo
Há-de o Sol queimar
E tu camarada
Põe-te em guarda
Que te vão matar
Venham lavradeiras
Mondadeiras
Deste campo em flor
Venham enlaçadas
De mãos dadas
Semear o amor
Ergue-te ó Sol de Verão
Somos nós os teus cantores
Da matinal canção
Ouvem-se já os rumores
Ouvem-se já os clamores
Ouvem-se já os tambores
Venha a maré cheia
Duma ideia
P´ra nos empurrar
Só um pensamento
No momento
P´ra nos despertar
Eia mais um braço
E outro braço
Nos conduz irmão
Sempre a nossa fome
Nos consome
Dá-me a tua mão
Ergue-te ó Sol de Verão
Somos nós os teus cantores
Da matinal canção
Ouvem-se já os rumores
Ouvem-se já os clamores
Ouvem-se já os tambores
José Afonso [faleceu a 23 de fevereiro de 1987]
Pode ser ouvido aqui: http://www.youtube.com/watch?v=fSyg_dETC-Q&feature=player_embedded
Era um redondo vocábulo
Uma soma agreste
Revelavam-se ondas
Em maninhos dedos
Polpas seus cabelos
Resíduos de lar,
Pelos degraus de Laura
A tinta caía
No móvel vazio,
Congregando farpas
Chamando o telefone
Matando baratas
A fúria crescia
Clamando vingança,
Nos degraus de Laura
No quarto das danças
Na rua os meninos
Brincando e Laura
Na sala de espera
Inda o ar educa
(LetrasdeMusicas.com.pt)
[Vá-se lá saber porquê, mas hoje deu-me uma de saudosismo de Zeca e esta é uma das minhas preferidas!]
[http://animaleja.no.sapo.pt/cravo.gif ]
"Somos filhos da madrugada"
não queremos voltar à noite escura,
e na luz clara de Abril
gritaremos até que a voz nos doa:
nem opressão, nem ditadura!
Já que tanto custou construir
a estrada da liberdade
não voltaremos a deixar surgir
os vampiros sedentos na cidade,
enrouqueceremos a gritar:
"somos livres de voar"!
24.04.09 - JM
É bom também irmos recordando Zeca Afonso, sabe-se lá o que nos espera!
VAMPIROS
No céu cinzento
sob o astro mudo Batendo as asas
Pela noite calada Vêm em bandos
Com pés veludo Chupar o sangue
Fresco da manada Se alguém se engana
com seu ar sisudo E lhes franqueia
As portas à chegada Eles comem tudo
Eles comem tudo Eles comem tudo
E não deixam nada A toda a parte
Chegam os vampiros Poisam nos prédios
Poisam nas calçadas Trazem no ventre
Despojos antigos Mas nada os prende
Às vidas acabadas São os mordomos
Do universo todo Senhores à força
Mandadores sem lei Enchem as tulhas
Bebem vinho novo Dançam a ronda
No pinhal do rei Eles comem tudo
Eles comem tudo Eles comem tudo
E não deixam nada No chão do medo
Tombam os vencidos Ouvem-se os gritos
Na noite abafada Jazem nos fossos
Vítimas dum credo E não se esgota
O sangue da manada Se alguém se engana
Com seu ar sisudo E lhe franqueia
As portas à chegada Eles comem tudo
Eles comem tudo Eles comem tudo
E não deixam nada Eles comem tudo
Eles comem tudo Eles comem tudo
E não deixam nada
http://www.youtube.com/watch?v=ZUEeBhhuUos
Coro da Primavera
Cobre-te canalha
Na mortalha
Hoje o rei vai nu
Os velhos tiranos
De há mil anos
Morrem como tu
Abre uma trincheira
Companheira
Deita-te no chão
Sempre à tua frente
Viste gente
Doutra condição
Ergue-te ó Sol de Verão
Somos nós os teus cantores
Da matinal canção
Ouvem-se já os rumores
Ouvem-se já os clamores
Ouvem-se já os tambores
Livra-te do medo
Que bem cedo
Há-de o Sol queimar
E tu camarada
Põe-te em guarda
Que te vão matar
Venham lavradeiras
Mondadeiras
Deste campo em flor
Venham enlaçadas
De mãos dadas
Semear o amor
Ergue-te ó Sol de Verão
Somos nós os teus cantores
Da matinal canção
Ouvem-se já os rumores
Ouvem-se já os clamores
Ouvem-se já os tambores
Venha a maré cheia
Duma ideia
P'ra nos empurrar
Só um pensamento
No momento
P'ra nos despertar
Eia mais um braço
E outro braço
Nos conduz irmão
Sempre a nossa fome
Nos consome
Dá-me a tua mão
Ergue-te ó Sol de Verão
Somos nós os teus cantores
Da matinal canção
Ouvem-se já os rumores
Ouvem-se já os clamores
Ouvem-se já os tambores
José Afonso