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Ar da Guarda

"Livre não sou, mas quero a liberdade. Trago-a dentro de mim como um destino." Miguel Torga

Ar da Guarda

"Livre não sou, mas quero a liberdade. Trago-a dentro de mim como um destino." Miguel Torga

...

Não era a minha alma que queria ter.
Esta alma já feita, com seu toque de sofrimento
e de resignação, sem pureza nem afoiteza.

Queria ter uma altura nova.
Decidida capaz de tudo ousar.
Nunca esta que tanto conheço, compassiva, torturada
de trazer por casa.
A alma que eu queria e devia ter…
Era uma alma asselvajada, impoluta, nova, nova,
nova, nova!

Irene Lisboa

Escrever - Irene Lisboa

 

Se eu pudesse havia de... de...

transformar as palavras em clava!

havia de escrever rijamente.

Cada palavra seca, irressonante!

Sem música, como um gesto,

uma pancada brusca e sóbria.

Para quê,

mas para quê todo o artifício

da composição sintáctica e métrica,

este arredondado linguístico?

Gostava de atirar palavras.

Rápidas, secas e bárbaras: pedradas!

Sentidos próprios em tudo.

Amo? Amo ou não amo!

Vejo, admiro, desejo?

Ou não... ou sim.

E, como isto, continuando...

 

E gostava,

para as infinitamente delicadas coisas do espírito

(quais? mas quais?)

em oposição com a braveza

do jogo da pedrada,

da pontaria às coisas certas e negadas,

gostava...

de escrever com um fio de água!

um fio que nada traçasse...

fino e sem cor... medroso...

Ó infinitamente delicadas coisas do espírito...

Amor que se não tem,

desejo dispersivo,

sofrimento indefinido,

ideia incontornada,

apreços, gostos fugitivos...

Ai, o fio da água,

o próprio fio da água poderia

sobre vós passar, transparentemente...

ou seguir-vos, humilde e tranquilo?