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Ar da Guarda

"Livre não sou, mas quero a liberdade. Trago-a dentro de mim como um destino." Miguel Torga

Ar da Guarda

"Livre não sou, mas quero a liberdade. Trago-a dentro de mim como um destino." Miguel Torga

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    Depois do dia mundial da poesia  e da Primavera anunciada há muito e antecipadamente, um dia de lembranças invernais no friozinho agreste de oriente. As palavras exaltadas recolheram suavemente aos sótãos da memória e retraíram-se. O sol só levemente trouxe os acres cheiros primaveris a lilás e a tarde harmonizou-se com as sentimentais notas de Neil Diamond (há quanto tempo!) na música do "Fernão Capelo Gaivota". Assim, às doces ternuras das palavras de ontem, juntou-se a terna doçura da música, esse poderoso lenitivo  das horas amargas e expansão das alegres. Afinal as amendoeiras já floriram!

Prece

 

Senhor, deito-me na cama
Coberto de sofrimento;
E a todo o comprimento
Sou sete palmos de lama:
Sete palmos de excremento
Da terra-mãe que me chama.

Senhor, ergo-me do fim
Desta minha condição:
Onde era sim, digo não,
Onde era não, digo sim;
Mas não calo a voz do chão
Que grita dentro de mim.

Senhor, acaba comigo
Antes do dia marcado;
Um golpe bem acertado,
O tiro dum inimigo...
Qualquer pretexto tirado
Dos sarcasmos que te digo.
 
Miguel Torga, Diário
 
    Porque há dias (ou tempos) em que a condição de mortais é mais premente e nos leva a reflectir no nada que somos, no dependentes que somos, na fragilidade que nos acompanha desde a nascença à sepultura!!! E Torga, apesar de médico (ou porque o era), sentiu-o bem e ninguém o soube dizer melhor que ele.