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Ar da Guarda

"Livre não sou, mas quero a liberdade. Trago-a dentro de mim como um destino." Miguel Torga

Ar da Guarda

"Livre não sou, mas quero a liberdade. Trago-a dentro de mim como um destino." Miguel Torga

Ícaro

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 (1901-1969)

 

A minha Dor, vesti-a de brocado, 
Fi-la cantar um choro em melopeia, 
Ergui-lhe um trono de oiro imaculado, 
Ajoelhei de mãos postas e adorei-a. 

Por longo tempo, assim fiquei prostrado, 
Moendo os joelhos sobre lodo e areia. 
E as multidões desceram do povoado, 
Que a minha dor cantava de sereia... 

Depois, ruflaram alto asas de agoiro! 
Um silêncio gelou em derredor... 
E eu levantei a face, a tremer todo: 

Jesus! ruíra em cinza o trono de oiro! 
E, misérrima e nua, a minha Dor 
Ajoelhara a meu lado sobre o lodo. 

José Régio, Poemas de Deus e do Diabo