Ar da Guarda
Ar da Guarda porque é forte, porque é farto, porque é fiel, porque é formoso e porque é frio. Porque é a coisa mais pura que cá temos. Porque é saudável! Porque é bom respirá-lo o que é sinal de estarmos vivos. Porque a Guarda é uma cidade de uma formosura feia. Porque a Guarda, guarda!
E sobre a nossa cidade Miguel Torga disse:
“Guarda, 25 de Fevereiro de 1945 – Cá ando a dar a volta à Estrela, como uma borboleta a circundar uma luz. Pelo caminho vou olhando também a sepultura do Sortelha, em Góis, o berço de Pêro da Covilhã, na dita, o lar de Pedro Álvares Cabral, em Belmonte, e a feitura forte e fria desta Guarda do passado. O circuito não finda aqui, claramente, mas é sempre aqui que eu me demoro mais, numa meditação que não tem fim. É uma introspecção do granito, uma coisa absurda e dura, que não sei clarificar. Entra nela a Sé gótica e pesada, contrafeita, a tentar subir ao céu numa ogiva, e a sentir toscos e serranos tamancos nos pés calosos, que não podem com tanta altura. A Idade Média a convidar tardiamente as fragas beiroas a um êxtase universal, e elas, atarracadas e maciças, com medo de uma tal aventura. Enfim, coisas minhas, que dão à própria pedra uma alma, uma fala, uma intenção, um destino –e fazem com que eu não conceba de mármore um canastro de guardar milhão.” Diário, III