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Ar da Guarda

"Livre não sou, mas quero a liberdade. Trago-a dentro de mim como um destino." Miguel Torga

Ar da Guarda

"Livre não sou, mas quero a liberdade. Trago-a dentro de mim como um destino." Miguel Torga

Domingos de Outono

  

      O Outono anuncia-se paulatinamente. São as manhãs frias cheias de gotículas faiscantes enamoradas dos raios de sol que as vem beijar às primeiras horas da manhã. São as sombras frescas contrastantes com as  tórridas e doentias soalheiras. São as tardes efervescentes de bandos traiçoeiros de mosquitos ávidos das últimas frutas demoradas nas árvores apodrecidas. São as noites a cheirar a lume atractivas pelo conchego das casas e pela brisa fria do norte impiedoso. Tudo começa a cheirar a Outono - apesar do sol teimosamente continuar intenso e doentio - até as tardes de Domingo com esse silêncio nostálgico que nos torna moles e desejosos do sofá  televiso e alienante. A não ser que façamos como o heterónimo de Pessoa:

 

    Domingo irei para as hortas na pessoa dos outros,

    Contente da minha anonimidade.   
    Domingo serei feliz — eles, eles...  
    Domingo... 
    Hoje é quinta-feira da semana que não tem domingo... 
    Nenhum domingo. — 
    Nunca domingo. — 
    Mas sempre haverá alguém nas hortas no domingo que vem. 
    Assim passa a vida, 
    Sutil para quem sente, 
    Mais ou menos para quem pensa: 
    Haverá sempre alguém nas hortas ao domingo,  
    Não no nosso domingo, 
    Não no meu domingo, 
    Não no domingo... 
    Mas sempre haverá outros nas hortas e ao domingo! 

 

 

Álvaro de Campos

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