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Ar da Guarda

"Livre não sou, mas quero a liberdade. Trago-a dentro de mim como um destino." Miguel Torga

Ar da Guarda

"Livre não sou, mas quero a liberdade. Trago-a dentro de mim como um destino." Miguel Torga

blues da morte de amor - Vasco Graça Moura (1942-2014)

já ninguém morre de amor, eu uma vez
andei lá perto, estive mesmo quase,
era um tempo de humores bem sacudidos,
depressões sincopadas, bem graves, minha querida,
mas afinal não morri, como se vê, ah, não,
passava o tempo a ouvir deus e música de jazz,
emagreci bastante, mas safei-me à justa, oh yes,
ah, sim, pela noite dentro, minha querida.

a gente sopra e não atina, há um aperto
no coração, uma tensão no clarinete e
tão desgraçado o que senti, mas realmente,
mas realmente eu nunca tive jeito, ah, não,
eu nunca tive queda para kamikaze,
é tudo uma questão de swing, de swing, minha querida,
saber sair a tempo, saber sair, é claro, mas saber,
e eu não me arrependi, minha querida, ah, não, ah, sim.

há ritmos na rua que vêm de casa em casa,
ao acender das luzes, uma aqui, outra ali.
mas pode ser que o vendaval um qualquer dia venha
no lusco-fusco da canção parar à minha casa,
o que eu nunca pedi, ah, não, manda calar a gente,
minha querida, toda a gente do bairro,
e então murmurarei, a ver fugir a escala
do clarinete: — morrer ou não morrer, darling, ah, sim.

Vasco Graça Moura, in "Antologia dos Sessenta Anos"

 

 

 

Em Abril

Em Abril floriu a liberdade

com cravos de vermelha cor;

em Abril por toda a cidade

se expandiu a reprimida dor

para festejar a pujante idade

de uma revolução em flor.

 

Um mar de gente saiu à rua

todo alvoroçado nas vontades

unido num sólido coração

capaz de ir buscar a Lua

para iluminar as verdades

ocultas na longa opressão.

 

O grito soltou-se bem alto

das bocas como uma só;

tremeu o Carmo e a Trindade

e foi tão grande o sobressalto

que sem piedade nem dó

se ouviu em uníssono: LIBERDADE!

 

E a cidade foi um espanto

de esperança e alegria:

as ruas engalanaram-se

os tanques abrilaram-se

a noite converteu-se em dia

e Grândola fez-se CANTO.

 

24.04.2014

 

JM

Mandamentos

Mandamentos

1. Não tenhas opiniões firmes, nem creias demasiadamente no valor de tuas opiniões.

2. Sê tolerante, porque não tens a certeza de nada.

3. Não julgues ninguém, porque não vês os motivos, mas só os atos...

4. Espera o melhor e prepara-te para o pior.

5. Não mates nem estragues, porque, como não sabes o que é a vida, exceto que é um mistério, não sabes que fazes matando ou estragando, nem que forças desencadeias sobre ti mesmo se estragares ou matares.

6. Não queiras reformar nada, porque, como não sabes a que leis as coisas obedecem, não sabes se as leis naturais estão de acordo, ou com a justiça, ou, pelo menos, com a nossa ideia de justiça.

7. Faz por agir como os outros e pensar diferentemente deles. Não cuides que há relação entre agir e pensar. Há oposição. Os maiores homens de ação têm sido perfeitos animais na inteligência. Os mais ousados pensadores têm sido incapazes de um gesto ousado ou de um passo fora do passeio.

 

Fernando Pessoa, do livro "Pessoa por Conhecer - Textos para um Novo Mapa" . Teresa Rita Lopes. Lisboa: Estampa, 1990.

Arte - Almada Negreiros, Retrato de Fernando Pessoa 1964

Mandamentos 1. Não tenhas opiniões firmes, nem creias demasiadamente no valor de tuas opiniões.2. Sê tolerante, porque não tens a certeza de nada.3. Não julgues ninguém, porque não vês os motivos, mas só os atos...4. Espera o melhor e prepara-te para o pior.5. Não mates nem estragues, porque, como não sabes o que é a vida, exceto que é um mistério, não sabes que fazes matando ou estragando, nem que forças desencadeias sobre ti mesmo se estragares ou matares.6. Não queiras reformar nada, porque, como não sabes a que leis as coisas obedecem, não sabes se as leis naturais estão de acordo, ou com a justiça, ou, pelo menos, com a nossa ideia de justiça.7. Faz por agir como os outros e pensar diferentemente deles. Não cuides que há relação entre agir e pensar. Há oposição. Os maiores homens de ação têm sido perfeitos animais na inteligência. Os mais ousados pensadores têm sido incapazes de um gesto ousado ou de um passo fora do passeio.Fernando Pessoa, do livro "Pessoa por Conhecer - Textos para um Novo Mapa" . Teresa Rita Lopes. Lisboa: Estampa, 1990. Arte - Almada Negreiros, Retrato de Fernando Pessoa 1964

Luar!

- Preciso do teu espaço!

Não mo queres dar?

 

- Ofereço-te um abraço

e um raio de luar!

 

- Preciso do teu carinho!

Não mo queres ofertar?

 

- Anda, faz comigo o caminho!

Levamos um raio de luar!

 

- Preciso da tua companhia!

Não me queres acompanhar?

 

- Dou-te toda a alegria

que há num raio de luar!

 

04.04.2014

J M

Horaciana

Narra-me os dias nítidos

 

as horas transparentes de cor;

 

debaixo desta sombra frondosa

 

 goza o dia intensamente.  

 

 

 

Lê Horácio e modera-te

 

nos prazeres que as sombras afagam  

 

e nos delírios consequentes.

 

 

 

Frui cada hora em si  

 

abstraído do bulício diário  

 

e aproveita cada momento  

 

na sua plenitude.

 

 

 

Goza moderadamente  

 

e assim terás a felicidade.     

 

 

 

JM