Podes dar uma centelha de lua, um colar de pétalas breves ou um farrapo de nuvem; podes dar mais uma asa a quem tem sede de voar ou apenas o tesouro sem preço do teu tempo em qualquer lugar; podes dar o que és e o que sentes sem que te perguntem nome, sexo ou endereço; podes dar em suma, com emoção, tudo aquilo que, em silêncio, te segreda o coração; podes dar a rima sem rima de uma música só tua a quem sofre a miséria dos dias na noite sem tecto de uma rua; podes juntar o diamante da dádiva ao húmus de uma crença forte e antiga, sob a forma de poema ou de cantiga; podes ser o livro, o sonho, o ponteiro do relógio da vida sem atraso, e sendo tudo isso serás ainda mais, anónimo, pleno e livre, nau sempre aparelhada para deixar o cais, porque o que conta, vendo bem, é dar sempre um pouco mais, sem factura, sem fama, sem horário, que a máxima recompensa de quem dá é o júbilo de um gesto voluntário.
E, afinal, tudo isso quanto vale ? Vale o nada que é tudo sempre que damos de nós o que, sendo acto amor, ganha voz e se torna eterno por ser único e total.
Metidos nesta pele que nos refuta, Dois somos, o mesmo que inimigos. Grande coisa, afinal, é o suor (Assim já o diziam os antigos): Sem ele, a vida não seria luta, Nem o amor amor.