Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

Ar da Guarda

"Livre não sou, mas quero a liberdade. Trago-a dentro de mim como um destino." Miguel Torga

Ar da Guarda

"Livre não sou, mas quero a liberdade. Trago-a dentro de mim como um destino." Miguel Torga

AS PALAVRAS

  

Atragantaram-se-me na garganta

e já não dizem porque nada são

e, apesar do esforço enorme, de anta,

nada significam ditas em vão.

 

Amareleceram nos sentidos, vazias,

ocas de sensações, inférteis de vidas

já nem tristezas são, nem sequer alegrias,

breves boninas, quiçá selvagens margaridas.

 

Deserto de ideias onde apenas a memória

provoca estragos áridos e abundantes,

nem às lembranças da passada glória

reverdecem um pouco as saudades constantes.

 

E agora onde encontrar águas milagrosas?

Onde mergulhar na vida se as sensações

fugiram afastadas por ilusões falaciosas?

Ainda há salvação nos adormecidos corações?

 

JM (30.05.2011)

Café do Molhe


Perguntavas-me 
(ou talvez não tenhas sido 
tu, mas só a ti 
naquele tempo eu ouvia) 

porquê a poesia, 
e não outra coisa qualquer: 
a filosofia, o futebol, alguma mulher? 
Eu não sabia 

que a resposta estava 
numa certa estrofe de 
um certo poema de 
Frei Luis de Léon que Poe 

(acho que era Poe) 
conhecia de cor, 
em castelhano e tudo. 
Porém se o soubesse 

de pouco me teria 
então servido, ou de nada. 
Porque estavas inclinada 
de um modo tão perfeito 

sobre a mesa 
e o meu coração batia 
tão infundadamente no teu peito 
sob a tua blusa acesa 

que tudo o que soubesse não o saberia. 
Hoje sei:escrevo 
contra aquilo de que me lembro, 
essa tarde parada, por exemplo. 

 

Manuel António Pina, "Nenhuma Palavra e Nenhuma Lembrança" (1999) 

Eduardo Lourenço - BMEL

Homenagem a Eduardo Lourenço

 

 

 

 

 

Eduardo Lourenço - Vida e Obra - Palestra

Sala Tempo e Poesia - 10H30 - 12H00

Com: João Tiago Pedroso de Lima

 

João Tiago Pedroso de Lima é Licenciado em Filosofia e Mestre em Filosofia Contemporânea pela Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra.

Vive em Évora e lecciona na Universidade desta cidade, onde realizou o doutoramento em Filosofia.

Publicou, em 2007, O Fogo do Espírito. Desporto, Olimpismo e Ética, obra que obteve o Prémio de Investigação da Academia Olímpica de Portugal (categoria de Ensaio).

É membro do Pólo da Universidade de Évora do NICPRI - Núcleo de Investigação em Ciência Política e Relações Internacionais.

 

 

 

Leituras de Eduardo Lourenço - Tertúlia

Espaço Eduardo Lourenço na Sala Nau de Ícaro - 18H00

 

Com: João Tiago Pedroso Lima, José Manuel Mota da Romana, Carlos Reis

Moderador: Vergílio Bento

 

 

 

 

 

Organização:   Colaboração:             Apoio:

 

            

 

Agora É

 

 

Agora é diferente
Tenho o teu nome o teu cheiro
A minha roupa de repente
ficou com o teu cheiro

Agora estamos misturados
No meio de nós já não cabe o amor
Já não arranjamos
lugar para o amor

Já não arranjamos vagar
para o amor agora
isto vai devagar
isto agora demora



Manuel António Pina
Poesia Reunida

Mágoas

 Espuma

 

 

 

A foto foi "roubada" à BMEL e reporta-se a um evento aqui anunciado e referente ao dia 12 de Maio. Tratou-se da apresentação do livro de um amigo, natural de Fiães, Trancoso, mas que estudou e viveu aqui na Guarda. Essa amizade, iniciada através de um livro e agor estreitada levou o autor a pedir-me que fizesse a apresentação deste seu mais recente "A espuma dos dias úteis". Tratando-se de alguém que viveu na Guarda, pensou que deveria fazer aqui a "entrega" pública, porque era um gesto que prova a ligação que tem à cidade. Só que deve ter ficado desiludido com a quantidade de público presente ( era pouco, mas de qualidade!)

Nós, guardenses, temos uma maneira muito estranha de estar face a estes acontecimentos culturais: na maior parte das vezes primamos pela ausência e quando comparecemos é porque a amizade nos obriga a isso. Não somos curiosos e parece que temos inveja de que outros publiquem. 

O poeta/narrador Cristino Cortes merecia mais da cidade de que fala no seu livro! Merecia mais pela obra publicada que fala por si pois tem já um carácter internacional! Quero crer que a ausência foi motivada pela emoção de saber que outro guardense, também poeta, tinha recebido o Prémio Camões nesse mesmo dia.

Temos em comum também o facto de nos preocuparmos com a herança paterna e desejarmos preservar o património: outras culturas! Eu por mim vou-me dedicar mais a estas últimas porque ao menos a mãe-terra sempre nos devolve com juros o resultado do trabalho que temos com ela e assim me liberto do cansaço que o viver em sociedade nos traz. 

Prémio Camões - Manuel A. Pina

O nosso Manuel António Pina é o Prémio Camões deste ano, com unanimidade do júri. Poeta, jornalista e autor de saborosas crónicas, natural do Sabugal, está ligado afectivamente à Guarda que há uns anos lhe prestou homenagem.

 

Completas


A meu favor tenho o teu olhar 
testemunhando por mim 
perante juízes terríveis: 
a morte, os amigos, os inimigos. 

E aqueles que me assaltam 
à noite na solidão do quarto 
refugiam-se em fundos sítios dentro de mim 
quando de manhã o teu olhar ilumina o quarto. 

Protege-me com ele, com o teu olhar, 
dos demónios da noite e das aflições do dia, 
fala em voz alta, não deixes que adormeça, 
afasta de mim o pecado da infelicidade. 

Manuel António Pina, in “Algo Parecido Com Isto, da Mesma Substância”

"Espuma dos dias úteis" - Cristino Cortes

 

 

  

  

Cristino Cortes nasceu em Fiães, Trancoso. Licenciou-se em Economia em Lisboa, onde reside actualmente. A maior parte da sua actividade profissional decorreu no âmbito do Ministério da Cultura.

Autor de variadíssimas obras publicadas em diversos estilos, Cristino Cortes oferece-nos, agora, com Espuma Dos Dias Úteis — Talvez Diário (1979 – 2009), que aqui se apresenta, um reflexo do seu extenso e profícuo percurso literário e um curioso registo de impressões de um escritor a tempo inteiro, atento ao mundo que o envolve e no qual procura deixar a sua marca.

 

 

 

Autor: Cristino Cortes

Apresentação do livro: José Manuel Monteiro

 

 

 

      

 

 

 

 

 

Mater / Mãe

 

mãe..jpeg

 

Dizer terra, fecundação, carinho, ...

Dizer ovo, madre, coração, ...

Dizer sémen, cuidado, marinho, ...

Dizer chuva, amor, paixão, ...

 

Dizer força, prazer, embrião, ...

Dizer húmus, maia, afecto, ...

Dizer coragem, arte, criação, ...

Dizer seio, úbere, tecto, ...

 

Dizer terra, femina, mulher

Dizer tudo e o princípio também

Dizer aquilo a que mais se quer

É dizer, simplesmente, MÃE!

 

(JM)

 

[Seriam 102 - sempre!]

MATER


 

Tu, grande Mãe!... do amor de teus filhos escrava, 
Para teus filhos és, no caminho da vida, 
Como a faixa de luz que o povo hebreu guiava 
À longe Terra Prometida. 

Jorra de teu olhar um rio luminoso. 
Pois, para batizar essas almas em flor, 
Deixas cascatear desse olhar carinhoso 
Todo o Jordão do teu amor. 

E espalham tanto brilho as asas infinitas 
Que expandes sobre os teus, carinhosas e belas, 
Que o seu grande dano sobe, quando as agitas, 
E vai perder-se entre as estrelas. 

E eles, pelos degraus da luz ampla e sagrada, 
Fogem da humana dor, fogem do humano pé, 
E, à procura de Deus, vão subindo essa escada, 
Que é como a escada de Jacó. 

Olavo Bilac, in "Poesias"