HOMEM DA GUARDA
Faz hoje meio século de existência este velho amigo, mas não amigo velho. Dá-se a coincidência de termos nascido na mesma freguesia e, dizem os mais velhos, ter havido lá muito para trás antepassados comuns. No entanto, aparece aqui não por esse motivo, mas por continuar a ser motivo de orgulho para todos os guardenses, não só pelo trabalho em prol da cidade, leia-se da cultura, não só pela obra que tem já publicada, mas também porque segunda-feira à noite vai receber das mãos da Sra. Ministra da Cultura o Diploma e Medalha de Mérito Cultural do Ministério da Cultura. Não é para todos! A sua obra fala por si e assim o reconheceu a Ministra da Cultura. Por cá, infelizmente, continua a ser pouco valorizado o seu trabalho.
Abraço de parabéns, caro amigo!
Fica um poema:
Há dez anos
mais ano menos ano
decidi que escreveria
um poema
por dia
na Sé Catedral da Guarda.
A Sé é um navio de pedra
encalhado
pousado
numa cidade medieval
que nos guardava dos espanhóis.
Prometi escrever
um poema
por dia
dentro do navio de granito
naufragado
parado
no centro de uma terra
que hoje aguarda os espanhóis.
Prometi mas não cumpri.
Escrevi um único poema
dentro do templo sem tempo.
Ao segundo dia desta aventura
sentado no convés do navio
a caneta caiu-me da mão
o corpo enregelou
e ficou imóvel
num barco imóvel.
Ainda lá estou.
Paralisado pelo frio
em estado de sólida quietude.
Um dia (amanhã, talvez)
o meu corpo de gelo
partir-se-á em mil pedacinhos.
A Guarda
que antes acolhia a Sé Catedral
e viaja agora a bordo do navio
de pedra
nem sequer o saberá.
30/12/10
Américo Rodrigues
[http://cafe-mondego.blogspot.com/2010/12/ha-dez-anos-mais-ano-menos-ano-decidi.html]