Tudo o que vivêramos
um dia fundiu-se
com o que estava
a ser vivido.
Não na memória
mas no puro espaço
dos cinco sentidos.
Havíamos estado no mundo, raso,
um campo vazio de tojo seco.
Depois, alguém
urbanizou o vazio,
e havia casas e habitantes
sobre o tojo. E eu,
que estivera sempre presente,
vi a dupla configuração de um campo,
ou a sós em silêncio
ou narrando esse meu ver.
As Fábulas
[Fiama Hasse Pais Brandão nasceu em Lisboa, em 1938 e aí morreu em 2007 ]
Mordi o pó, quebrada a minha lança, E meu pendão real feito em pedaços! Herói falhado, abandonou-me a esp`rança Que em tempos idos me estendera os braços...
Meus olhos tão alegres em criança, Tinham só amarguras e cansaços Em vez do sonho que me fora herança De avós remotos-Césares ou Tassos...
Qual mísero mendigo de longada Batendo às portas, sem que dêem nada À mão que leva em súplica, estendida,
Olhei as minhas pobres mãos morenas, E vi que nelas me ficara, apenas, Um jeito de pedir esmola à vida...
João Braz
[João Braz Machado (São Brás de Alportel, 13 de Março de 1912 - Portimão, 22 de Junho de 1993).]
Era um redondo vocábulo
Uma soma agreste
Revelavam-se ondas
Em maninhos dedos
Polpas seus cabelos
Resíduos de lar,
Pelos degraus de Laura
A tinta caía
No móvel vazio,
Congregando farpas
Chamando o telefone
Matando baratas
A fúria crescia
Clamando vingança,
Nos degraus de Laura
No quarto das danças
Na rua os meninos
Brincando e Laura
Na sala de espera
Inda o ar educa
Por onde andam? Pelas Universidades do país, com sucesso nos estudos, ao que consta, provando assim que os alicerces estavam lá.
Algumas continuam a escrever com êxito.
Todas deviam continuar a escrever porque sabem: mas a vida e a preguiça lusitanas não ajudam - parece que o ambiente medíocre das universidades também não. É pena!