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Ar da Guarda

"Livre não sou, mas quero a liberdade. Trago-a dentro de mim como um destino." Miguel Torga

Ar da Guarda

"Livre não sou, mas quero a liberdade. Trago-a dentro de mim como um destino." Miguel Torga

Luar de Janeiro

Luar de janeiro,

Fria claridade

Á luz delle foi talvez

Que primeiro

A bocca dum português

Disse a palavra saudade...

Luar de platina,

Luar que allumia

Mas que não aquece,

Photographia

D'alegre menina

Que ha muitos annos já... envelhecesse.

Luar de janeiro,

O gelo tornado

Luminosidade...

Rosa sem cheiro,

Amor passado

De que ficasse apenas a amizade...

Luar das nevadas,

Algido e lindo,

Janellas fechadas,

Fechadas as portas,

E elle fulgindo,

Limpido e lindo,

Como boquinhas de creanças mortas,

Na morte geladas

-E ainda sorrindo...

Luar de janeiro,

Luzente candeia

De quem não tem nada,

-Nem o calor dum brazeiro,

Nem pão duro para a ceia,

Nem uma pobre morada...

Luar dos poetas e dos miseraveis,

Como se um laço estreito nos unisse,

São similhaveis

O nosso mau destino e o que tens...

De nós, da nossa dôr, a turba - ri-se

-E a ti, sagrado luar ... ladram-te os cães!
 

Augusto Gil, Luar de Janeiro (1909)

 

[Acabei de chegar da rua, regressando do meu local de trabalho, e, ao olhar para a beleza da LUA cheia, lembraram-me os versos do poeta e não resisti a transcrevê-los na sua grafia original de há 100 anos atrás. Com tanta beleza e recordação o frio agreste da meseta fica para segundo plano!!!!]

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