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Ar da Guarda

"Livre não sou, mas quero a liberdade. Trago-a dentro de mim como um destino." Miguel Torga

Ar da Guarda

"Livre não sou, mas quero a liberdade. Trago-a dentro de mim como um destino." Miguel Torga

A noite desce

A noite desce, o calor soçobra um pouco, 
Estou lúcido como se nunca tivesse pensado 
E tivesse raiz, ligação direta com a terra 
Não esta espécie de ligação de sentido secundário observado à noite. 
À noite quando me separo das cousas, 
E m'aproximo das estrelas ou constelações distantes — 
Erro: porque o distante não é o próximo, 
E aproximá-lo é enganar-me.

 

Alberto Caeiro

Da minha aldeia

 

Da minha aldeia vejo quanto da terra se pode ver no Universo... 
Por isso a minha aldeia é tão grande como outra terra qualquer 
Porque eu sou do tamanho do que vejo 
E não, do tamanho da minha altura... 

Nas cidades a vida é mais pequena 
Que aqui na minha casa no cimo deste outeiro. 
Na cidade as grandes casas fecham a vista à chave, 
Escondem o horizonte, empurram o nosso olhar para longe de todo o céu, 
Tornam-nos pequenos porque nos tiram o que os nossos olhos nos podem dar, 
E tornam-nos pobres porque a nossa única riqueza é ver.

 

Alberto Caeiro

Quem não ama não vive - António Botto

 

Já na minha alma se apagam 
As alegrias que eu tive; 
Só quem ama tem tristezas, 
Mas quem não ama não vive.

 

Andam pétalas e folhas 
Bailando no ar sombrio; 
E as lágrimas, dos meus olhos, 
Vão correndo ao desafio.

 

Em tudo vejo Saudades! 
A terra parece morta. 
- Ó vento que tudo levas, 
Não venhas à minha porta!

 

E as minhas rosas vermelhas, 
As rosas, no meu jardim, 
Parecem, assim caídas, 
Restos de um grande festim!

 

Meu coração desgraçado, 
Bebe ainda mais licor! 
- Que importa morrer amando, 
Que importa morrer d'amôr!

 

E vem ouvir bem-amado 
Senhor que eu nunca mais vi: 
- Morro mas levo comigo 
Alguma coisa de ti.

 

António Botto